O governo federal sofreu uma derrota no plenário do Senado Federal após tentar aprovar um requerimento para acelerar a análise do projeto que recria o seguro obrigatório para vítimas de acidente de trânsito, conhecido como DPVAT, nesta terça-feira (23).
A ideia do governo era pular etapas na tramitação da proposta e levar o tema direto para o plenário do Senado, composta por uma maioria de senadores pró-governo.
O projeto já foi acelerado e está tramitando diretamente na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) do Senado, sem ter passado por outras comissões antes. A previsão é que o projeto seja votado nesta quarta-feira (24), como primeiro item.
‘Jabuti’
Para uma votação direto no plenário, o governo precisaria de maioria simples. Nesta tarde, 64 senadores estavam presentes, entre eles, todos os oito do PT. Já entre os 17 ausentes, a maioria era de oposição.
Após o requerimento de urgência ser lido pelo presidente Rodrigo Pacheco (PSD-MG), líderes da oposição se posicionaram contrários a possibilidade de votação do pedido no plenário sem que ele antes fosse apreciado pela CCJ.
Entre os argumentos usados para não acelerar o texto está a inclusão de um tema não relacionado ao assunto original da proposta, o que é chamado no jargão do Congresso de “jabuti”.
Ainda durante discussão na Câmara dos Deputados, a proposta incorporou um artigo que permite a antecipação da análise de receitas do governo federal do segundo para o primeiro bimestre deste ano.
“Nós não tivemos ainda nem sequer oportunidade de nos debruçarmos sobre esse tema na própria Comissão de Constituição e Justiça do Senado da República e nós estamos reintroduzindo um seguro extremamente regressivo que penaliza os mais pobres, ao mesmo tempo fazendo mais uma espécie de amputação, desculpe, de acréscimo ao famigerado arcabouço fiscal”, afirmou o líder da oposição, Rogério Marinho (PL-RN).
Após acordo com o líder do governo, Jaques Wagner (PT-BA), os parlamentares chegaram a um acordo para que o requerimento fosse retirado de pauta, à espera de votação na CCJ nesta quarta-feira.
Novo seguro
O novo seguro obrigatório foi aprovado pela Câmara dos Deputados no começo do mês. Se aprovado, o seguro passará a se chamar Seguro Obrigatório para Proteção de Vítimas de Acidente de Trânsito (SPVAT).
Câmara aprova volta do DPVAT, seguro obrigatório de veículos
Ele funcionará como um seguro obrigatório para indenizações de danos causados por veículos ou por suas cargas e deverá ser pago por todos os donos de veículos.
DPVAT: o que se sabe sobre a possível volta do seguro, e como ele deve funcionar
A cobrança do DPVAT foi extinta durante o governo do presidente Jair Bolsonaro. A última vez que os donos de veículos pagaram o DPVAT foi em 2020. Desde 2021, a gestão do saldo passou da seguradora Líder para a Caixa Econômica Federal.
No início deste ano, entretanto, o governo anunciou que os recursos estavam acabando. Com isso, enviou um projeto de lei complementar ao Congresso para recriar o seguro.
Entre as justificativas, o governo afirmou que “decorridos praticamente três anos de funcionamento do seguro obrigatório em regime emergencial e transitório, faz-se necessário estabelecer novas bases legais para assegurar de forma perene e sustentável e adequada para as vítimas de trânsito”.
Valores e regras
O principal ponto de interesse dos motoristas ainda não foi definido: o valor a ser cobrado pelo seguro será estabelecido após a aprovação do projeto pelo Congresso.
A cobertura do novo seguro vai gerar indenização por:
morte;
invalidez permanente, total ou parcial; e
reembolso de despesas com assistências médicas, serviços funerários e reabilitação profissional das vítimas que possa ter desenvolvido invalidez parcial.
O seguro será pago para todos que apresentarem prova do acidente e dos danos que ele causou, não importando se foi causado com ou sem intenção.
Os valores das indenizações serão estabelecidos pelo Conselho Nacional de Seguros Privados. O fundo seguirá sendo gerido pela Caixa.
O texto também prevê que entre 35% e 40% do valor arrecadado pelo fundo sejam repassados aos municípios e estados onde houver serviço municipal ou metropolitano de transporte público coletivo.
Avaliação de ampliação de receitas
O “jabuti” incluído pela Câmara no projeto permitirá que o governo antecipe a execução de gastos extras ao Orçamento.
Pelas regras do arcabouço fiscal, aprovado no ano passado, o governo só poderá fazer essas despesas extras caso seja verificado um aumento de receitas – em relação ao inicialmente previsto nas contas do ano – no relatório de avaliação do Orçamento relativo ao segundo bimestre. Esse relatório será divulgado em 22 de maio.
Mas caso o texto seja aprovado pelo Congresso, o governo poderá gastar com crédito suplementar com base no aumento de receitas verificada no relatório do primeiro bimestre, que já foi divulgado. Isso permitiria ao governo aumentar as despesas em R$ 15 bilhões.
A mudança no arcabouço foi mal avaliada pela oposição.
“Pela legislação, não se pode incluir uma matéria estranha [ao projeto], ainda mais dessa forma. Se é preciso uma lei complementar para alterar o arcabouço, faça uma lei complementar. Mas no meio de uma discussão do DPVAT surgir um tema totalmente estranho, não faz sentido”, disse o deputado Marcel Van Hattem (Novo-RS) à época da aprovação.